sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Recapturada

Os elementos estavam à solta naquela noite: o vento soprava furiosamente com rajadas fortes e as bátegas de chuva precipitavam-se sumo às janelas do hospital psiquiátrico; todavia, dentro das instalações, o silêncio reinava. O corredor principal estava vazio, para além de pouco iluminado. Apenas um ou outro carrinho podiam ser avistados.
Então, dois médicos surgiram por uma porta e começaram a percorrer o corredor, lentamente, dando uma última ronda antes de irem para casa e deixarem o edifício entregue unicamente ao segurança. Verificando se os pacientes dentro dos quartos estavam adormecidos, chegaram ao compartimento onde estava a recém-chegada, e suspiraram. Ela ainda estava acordada, de joelhos, aparentemente gritando apesar da mordaça que tinha na boca. Os médicos olharam pelo vidro reforçado.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

O casamento (parte 2)


É estranho, mas a chegada da manhã fez-me entrar num estado tal que não me recordo dos detalhes de preparação do casamento, o vestir o vestido, o arranjar o cabelo, a maquilhagem… Era como se estivesse sob o efeito de qualquer substância, silenciosa, cooperativa ao máximo, quase como uma marioneta…
Acho que “acordei” apenas quando o fotógrafo saiu do quarto. Dei por mim a pensar “está quase… só mais um par de horas” e sentei-me na cama, tentando acalmar-me, enquanto sentia o coração a bater que nem doido.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

O casamento (parte 1)

- Andrea, não devias ter lá ido! – gritou Márcia – É pedir-te demasiado que te comportes como deve ser?!
- Amor, já te pedi desculpa. – respondi, de voz embargada – É que… é que simplesmente aconteceu.
- “Simplesmente aconteceu”… como raio é que tu “simplesmente” beijas um gajo?
Baixei os olhos. Sabia que ela estava certa, mas isso não me fazia sentir melhor. Eu havia-a traído, apesar de ter sido apenas um beijo. Claro que Márcia iria dizer “nunca é apenas um beijo!”… e dei por mim a achar que ela tinha razão.
Eu nem sabia porque tinha saído sem a minha namorada. Ela teve de ficar a dormir naquela noite, e eu podia ter ficado a descansar com ela, mas estava com tanta vontade de sair e divertir-me que desafiei alguns amigos a irmos a uma discoteca não muito longe de Corroios. Assim que falei nisso à Márcia, reparei que ela ficou chateada, mas tentou escondê-lo de mim… mesmo assim fui lá, bebi demais e acabei a dançar com um gajo qualquer, a roçar-me nele, e, eventualmente, a dar-lhe um enorme linguado, até que os meus amigos repararam que eu não estava nos meus melhores dias e me levaram até casa.
- Tens razão, Márcia. – disse, com uma lágrima a escorrer-me à cara abaixo – Eu… eu não sei o que me passou pela cabeça, eu… eu estava bêbada, fui estúpida…
- Pois foste. – ela interrompeu-me.
- Mas eu prometo-te, amor… não volta a acontecer.
- Tens toda a razão. Não vai voltar a acontecer.
Levantei o meu olhar para a encarar. O seu tom de voz tinha sido estranho.
- O que queres dizer?
Ela agarrou-me pelo antebraço com força, de tal forma que senti os seus dedos a enterrarem-se na minha carne; depois, arrastou-me para o nosso quarto e atirou-me para cima da cama.
- Porque, agora, minha namoradinha, eu vou-te violar; e, no deste sábado a oito, vais-te casar comigo.
O meu coração pareceu parar.
- Casar…?

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Sonhos

(história anterior)

Abri os olhos, respirei fundo e espreguicei-me. Aquele sonho ainda me estava bem vivo na memória, e relembrar todos os seus detalhes acordou a minha ratinha, o que me fez levar a mão lá para a tentar acalmar. Foi então que os meus dedos sentiram uma ligeira humidade nos lençóis, na zona onde o meu baixo-ventre havia estado encostado, e senti-me corar.